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RUPTURA da realidade…

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Tem algo no silêncio de um lugar abandonado que gruda na gente, feito sombra teimosa que se esconde nos cantos da mente. Não importa o quanto eu tente escapar de mim mesmo, minha cabeça tem um jeito cruel de me puxar de volta para o mesmo labirinto. Começo a me perguntar se algum dia fui eu quem escolheu estar aqui. Talvez já estivesse escrito, como um destino que a gente não percebe até ser tarde demais. Tudo o que sei é que agora estou aqui, nesse fim de linha onde o tempo se desfaz numa névoa grossa, sem começo nem fim.

O prédio à minha frente, com suas paredes descascadas e janelas quebradas, parece um espelho do meu próprio estado. Já estive aqui antes. Acho. Não sei mais no que confiar — minha memória virou um borrão. Nada parece real. Ou talvez tudo seja real demais.

O medo que sinto vem desse lugar ou do que ele me obriga a lembrar? Andei por este corredor mais vezes do que deveria, e, a cada vez, ele se reinventa, como um quebra-cabeça que muda antes de ser resolvido. A cada o, uma parte de mim se dissolve. Meu coração martela, minha respiração pesa, minha mente tropeça em si mesma.

A porta range quando a empurro com dedos trêmulos. O cheiro de mofo e decadência me invade. Eu deveria ter voltado. Por que não voltei?

A lembrança vem, turva como sempre. Um nome se repete na minha cabeça, sussurrado como uma oração esquecida. Ela. Conheci alguém aqui. Ou será que é exatamente esse o problema? Não lembro. Vi alguém. Ou vi de novo. Ou nunca vi. O nome martela dentro de mim como um eco de algo que não deveria ser esquecido.

O que eu fiz aqui? O que fiz? Quem era ela?

Me jogo numa cadeira torta, o estalo da madeira soando alto demais, como um martelo sentenciando um julgamento. Há algo mais. Algo… mais escuro. Um vazio que cresce dentro de mim, uma prisão sem grades. Tento falar, mas minha voz morre antes de nascer. Tento lembrar, mas as memórias escorrem pelos meus dedos como areia fina.

Ao meu redor, móveis em ruínas, paredes manchadas, marcas que sugerem uma violência antiga. Me mexo, e o peso no meu corpo aumenta. Como se o lugar estivesse me puxando, sugando, absorvendo cada centelha de energia que me resta.

Então, escuto.

Um sussurro.

Baixo, distante, mas real.

Vindo do corredor sem luz.

Não é um som que se ignora. É uma voz, fraca, insistente. Chamando meu nome.

Aquela voz.

Meu corpo se recusa a obedecer. O medo agora é mais que um aperto no peito — ele se espalha pelos meus ossos, pelos meus nervos, até se tornar tudo o que existe. Algo me observa. Algo me quer.

E eu já sei. Sempre soube.

A porta range devagar, como se fosse empurrada por mãos invisíveis. Não há vento aqui. Só o sopro gelado do que quer que esteja esperando. O ar pesa, espesso, como se o medo estivesse dobrando a própria realidade ao meu redor.

E então, ela aparece.

Ou melhor… O que restou dela.

Não é mais uma pessoa. É uma coisa. Uma sombra retorcida, uma mancha na realidade, uma presença que se alimenta de algo muito mais profundo do que carne e sangue. Seu corpo é um borrão, um esboço inacabado. Seu rosto… seus olhos… ou o que deveria ser seus olhos… me encaram com um vácuo que me suga por dentro.

“Você nunca deveria ter vindo”, ela diz. Mas a voz não sai de sua boca. Ela nasce dentro da minha cabeça, uma sentença fria e inevitável.

Tento gritar. Nada.

Meu corpo está travado, minha garganta fechada, como se o próprio ar tivesse se tornado cimento. O medo não está mais apenas ao meu redor. Ele é meu sangue, meu pensamento, meu ser.

E o vazio cresce. Ele não é um buraco a ser preenchido. Não. Esse vazio tem fome. Tem vontade própria. E ele me devora.

Eu sei o que aconteceu.

Sei o que ela foi.

Sei o que eu fiz.

Eu fiz isso. Eu criei esse lugar. Criei essa realidade. Sou a rachadura por onde tudo desmoronou.

E agora? Agora não há mais escapatória.

O medo não está lá fora.

Ele sou eu.

Ele é tudo o que restou.

O ar pesa. Denso, grudento, sufoca como uma mortalha invisível. Cada respiração arrasta um gosto metálico, um peso morto que se instala no peito e não sai. O mundo ao meu redor parece diluir-se, esparramando-se como tinta preta em água suja. Tudo cede, escorre, afunda.

E então, eu vejo. Não bem um rosto, mas uma sombra parada ali, imóvel. Como se tivesse sempre estado ali. Como se estivesse esperando. Meu corpo reage antes da minha mente – um arrepio cortante, um frio na espinha que se espalha como um vírus. Algo dentro de mim se torce, se encolhe, se estilhaça.

A sombra respira sem mexer um músculo. Ou talvez seja o espaço ao redor dela que se contrai e expande, como um pulmão invisível sugando o que resta do ar. A escuridão pulsa, viva, com fome. Me sinto afundar. Há luz aqui? Ainda existe luz? Se existe, é fraca, doente, prestes a ser devorada.

Eu fiz isso. Eu fiz esse lugar. Essa cela. Esse vazio.

A sombra se molda — primeiro um borrão, depois um contorno definido. Por um instante, quase reconheço. Mas não é ela. Não é a mulher que amei, ou que achei ter amado. O que está ali é uma casca oca, um eco deformado, um reflexo sujo de mim mesmo. Seu rosto se dobra e desdobra, se estica, se desfaz. Os olhos — dois buracos negros, duas bocas famintas — me encaram, e tudo dentro de mim se esfarela. Quero olhar para outro lado, mas não consigo. Eles me puxam. Me sugam. Me devoram.

Então, ela fala. Mas não há som. Só um sussurro que nasce dentro de mim, rastejando pela espinha como um verme gelado.

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[C]Tem algo no silêncio de um lugar abandonado que gruda na gente, feito sombra te
“Você não vai escapar. Nunca.”

Não é uma ameaça. É um veredito.

Meu coração dispara. O medo sobe quente pela garganta, amargo, sufocante. Um grito se forma, mas não sai. Eu deveria ter ido embora. Eu deveria ter entendido antes. Isso não é um prédio. Isso não é só um lugar. Isso é um túmulo, construído com tudo o que enterrei dentro de mim.

Agora é tarde. Não dá pra correr. Não de mim mesmo.

A sombra se dissolve, depois se refaz. Como fumaça aprisionada num molde invisível. Meus olhos captam flashes. Um rosto. O rosto dela. Mas não como lembro. Não quente, não vivo. Cinza. Frio. Como uma fotografia antiga esquecida ao sol. E aqueles olhos… aqueles olhos não acusam. Eles sabem. Eles sempre souberam.

E eu também sei.

O horror que me engole não é um erro. Nunca foi um erro. Foi uma escolha. Minha. Eu cavei esse buraco. Eu me joguei dentro dele. Eu quis me perder, quis apagar tudo, perseguir algo que nunca existiu. A verdade esteve o tempo todo ali, berrando no meu ouvido. Mas eu escolhi não ouvir.

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[C]Tem algo no silêncio de um lugar abandonado que gruda na gente, feito sombra te
“Você está preso aqui. Como eu.”

Mas não é mais a voz dela. É a minha.

O espaço ao redor range, treme, desmorona. Mas não é o prédio que está caindo. Sou eu. Minhas memórias racham, minha mente se estilhaça. Tento correr, mas é inútil. Cada o me afunda mais, me suga para dentro.

Ela — ou o que sobrou dela — se aproxima. Os olhos, aqueles buracos sem fim, brilham com algo pior do que escuridão.

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[C]Tem algo no silêncio de um lugar abandonado que gruda na gente, feito sombra te
“Você nunca vai se libertar de si mesmo.”

A frase ecoa dentro de mim. Minha voz. Minha sentença.

E então, tudo cede. O chão, as paredes, o tempo.

Eu.

Caio num vazio que não acaba. Não há para onde ir. Só queda. Só sombra.

Eu sou a escuridão. Eu sou o erro.

E, assim, deixo de ser.

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[C]Tem algo no silêncio de um lugar abandonado que gruda na gente, feito sombra te

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Analista • [Revisão|link.com]

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