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Entre a Realidade e a Loucura!

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Entre a Realidade e a Loucura!-[IMG=B3E]
[C] A primeira vez que vi alguém que não devia estar lá, eu tinha 12 anos. Era madru

A primeira vez que vi alguém que não devia estar lá, eu tinha 12 anos. Era madrugada, e a casa respirava aquele silêncio pesado que dá a sensação de que até as paredes tão ouvindo. ‘Tava sentado na cama, só eu e a escuridão, quando ouvi. Não foi alto, nem muito baixo. Um sussurro, daqueles que arrepiam até os ossos. Chamava meu nome.

Levantei os olhos, e lá estava ela, minha avó, morta fazia meses. Ela parecia a mesma: o coque sempre firme, o vestido florido que ela adorava, o jeito de quem sabia mais do que mostrava. Mas alguma coisa não batia. O rosto dela parecia… esticado, como se alguém tivesse puxado demais os cantos. E o sorriso, meu Deus, aquele sorriso. Era o tipo de coisa que faz você querer arrancar os próprios olhos pra nunca mais ver.

“Vem cá, menino”, ela disse, com a voz calma e cortante.

Eu? Eu não fui. Nem se minha vida dependesse disso.

Depois daquele dia, minha vida virou um tabuleiro todo bagunçado, com peças que não encaixavam de jeito nenhum. Era como andar numa corda bamba, mas sem o chão por perto pra caso eu caísse.

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[C] A primeira vez que vi alguém que não devia estar lá, eu tinha 12 anos. Era madru

Com o tempo, me acostumei. Quero dizer, mais ou menos. Vultos ando pelo canto do olho, sombras onde não devia ter nenhuma. Mas às vezes, ah, às vezes, eram pessoas inteiras. Ou quase. Com o tempo, me acostumei. Quero dizer, mais ou menos. Vultos ando pelo canto do olho, sombras onde não devia ter nenhuma. Mas às vezes, ah, às vezes, eram pessoas inteiras. Ou quase.

Teve uma noite que eu ‘tava no sofá, meio largado, quando percebi que não estava sozinho. Olhei pro lado e lá estava ele: um homem de terno, alinhadíssimo, cara de quem tava indo ou voltando de um enterro. Só que ele não tinha rosto. Nada. Liso como um espelho sem reflexo.

Fiquei paralisado. Cada segundo parecia se esticar, como se o relógio tivesse esquecido de funcionar. Quando finalmente consegui me mexer, corri. Feito louco. Me enfiei debaixo do cobertor, como se aquele pedaço de pano pudesse me salvar.

Minha família achava que eu ‘tava pirando. “É estresse, filho, relaxa”, eles diziam. Fui atrás de ajuda. Psicólogos, psiquiatras, remédios pra desligar minha cabeça. Diagnóstico: esquizofrenia. Beleza. Tomei os remédios, e o mundo ficou meio turvo, como um filme mal editado. Mas os “visitantes”? Ah, esses continuaram vindo.

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[C] A primeira vez que vi alguém que não devia estar lá, eu tinha 12 anos. Era madru

Um dia, do nada, me vi parado na frente de uma livraria. Entrei, sem saber o que ‘tava procurando. E lá estava ele: um livro. “Entre Dois Mundos: A Vida dos Médiuns”. O título parecia me chamar, quase gritando.

Folheei, e cada frase parecia cutucar um canto da minha cabeça que eu não sabia que existia. Tudo aquilo me soava familiar demais. Seria possível? Talvez eu não fosse louco, afinal?

Isso virou minha nova obsessão. Pesquisei, conversei com quem dizia entender do assunto. Alguns me trataram como se eu fosse só um curioso, outros como se eu fosse um deles. E aí bateu a dúvida: será que tudo isso era algo que eu ‘tava lutando pra negar, mas que sempre esteve lá?

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[C] A primeira vez que vi alguém que não devia estar lá, eu tinha 12 anos. Era madru

Era uma daquelas noites em que até a rua parece ter dado tchau, sumido na solidão. A lua ‘tava encolhida, escondendo a cara, se fazendo de difícil, como quem não quer ser vista. E foi aí, sem mais nem menos, que ele apareceu de novo. Só que dessa vez, ‘tava bem mais perto. Não ouvi nada, nem um suspiro do vento, nem o estalo de um galho, mas, de repente, lá estava ele. O homem. Alto, magro, com o terno preto tão escuro que parecia ter saído de um pesadelo, engolindo toda a luz ao redor. O chapéu cobria metade da cara, mas os olhos… aqueles olhos… Eles brilhavam de um jeito que não dava pra desviar o olhar. Era como se ele tivesse roubado um pedaço da lua e colocado nos próprios olhos, como dois faróis que atravessam qualquer escuridão. E aquele sorriso, puta que pariu, era mais afiado que faca de açougueiro. Era fino, quase um sussurro, mas tão cortante que dava até medo de se aproximar.

“Você sabe o que tá acontecendo, não sabe?”, ele falou, e a voz dele entrou na minha mente com a suavidade de uma onda, mas forte o suficiente pra me derrubar.

Eu sabia. Mas, sinceramente, não queria saber. Não queria entender, nem aceitar. Só queria que ele sumisse, que aquilo tudo fosse só mais um pesadelo qualquer, uma daquelas lembranças ruins que a gente empurra pra debaixo do tapete.

Antes que eu pudesse pensar em dizer qualquer coisa, ele sumiu. Como se fosse só uma sombra que se derrete ao toque da primeira luz do amanhecer.

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[C] A primeira vez que vi alguém que não devia estar lá, eu tinha 12 anos. Era madru

Fui atrás de tudo. Médico, remédio, fiz até promessa. Mas as sombras estavam sempre ali, perto de mim, como um filme ruim que você assiste e não consegue desligar. Aí, alguém me soltou: “Vai num terreiro de Umbanda. Vai lá, quem sabe você encontra a resposta que procura.”

Eu nunca fui muito fã dessas paradas, mas sei lá, na hora parecia menos pior que continuar me afundando no vazio. Fui. Quando entrei, o ar estava pesado, mas tinha algo ali… estranho, mas reconfortante. Como se o próprio tempo tivesse parado pra me observar.

Foi lá que encontrei a mulher. Ela me encarou com uma intensidade que fez até o fundo da minha alma tremer. E falou, sem rodeios: “Você não tá sozinho. Tem alguém contigo.”

“Quem?”, perguntei, a voz saindo fraquinha, com medo de ouvir a resposta.

“Seu Caveira.”

Ele não apareceu mais, mas ficou. Presença constante, como sombra que você tenta afastar, mas não consegue. Às vezes, quando eu ‘tava mais perdido, mais fraco, parecia que a presença dele me dava forças pra continuar. Como se eu não precisasse entender tudo de uma vez, só aceitar. Aceitar e seguir.

Hoje, olhando para trás, vejo que talvez a vida não seja sobre encontrar todas as respostas. Talvez seja mais sobre aprender a viver com as perguntas, mesmo que elas nunca tenham uma resposta certa. No meio dessa bagunça toda, Seu Caveira se tornou minha âncora. Não me deu as respostas que eu procurava, mas me deu algo mais valioso: coragem. Coragem pra andar, mesmo que a estrada esteja escura e não tenha sinal de que vai melhorar.

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